“O estilo é o homem.”
Álvaro Salazar
Idealizado e fundado no decorrer de 2001, o Atelier de Composição é uma associação cultural vocacionada para a divulgação e promoção da música portuguesa contemporânea. Entre as suas actividades conta-se a publicação de livros, a organização de concertos, conferências, encontros de compositores, exposições, publicações de partituras entre outros.
É pela mão do Atelier de Composição que nos surge um livro, um CD e um documentário sobre Álvaro Salazar (Porto, 1938 -). Compositor, chefe de orquestra, professor e crítico musical, Álvaro Salazar é uma figura incontornável do panorama musical nacional e internacional. A obra Estudos Incomuncantes I/A, gravada na Casa da Música no Porto, conta com a participação de Eugénia Chvets (piano I), Elsa Marques Silva (piano II), Inês Vicente (recitante), membros do Coral de Letras da Universidade do Porto (Ana João Anahory, Paula Brochado, Mariana Carrilho, Jorge Grave, Inês Marques, Pedro Marques, João Vasco Rodrigues e Matias Schöner), José Luís Borges Coelho (direcção coral) e Virgílio Melo na direcção artística. O CD apresenta-nos também um booklet com o texto de 2007 de Álvaro Salazar, precisamente intitulado Estudos Incomunicantes, como introdução à música que se escutará (“Breve poalha alada de um alfabeto ignoto, as flébeis esparsas cintilações do nada vindas, ao nada recolhendo. Ou marcos — dir-se-á — pelo oco da noite deslizantes, insondáveis sinais que o silêncio esculpiu, medindo o Tempo o Espaço os mundos solitários. Dilui o manto negro voraz ressonâncias, as longínquas pulsões que poucos sentem mesmo se escutando”), música essa que mostra imediatamente ao ouvinte, nos seus primeiros compassos, que estamos perante música de Álvaro Salazar. Para quem for ousado, sugere-se a audição associada a uma meditação intensa do conteúdo do texto de Álvaro Salazar, que nos transportará para a dimensão do comunicante/incomunicante. Avisa-se o leitor/ouvinte que poderá com toda a probabilidade sentir uma revolução no domínio das sensações e dos sentidos ao ouvir a obra de Álvaro Salazar. Muito interessante é a inclusão de iconografía no CD, quatro fotografias de alta qualidade artística de Bruno Nacarato, que são um registo a ter em conta para o futuro.
Para além do CD contamos também com um valioso livro sobre Álvaro Salazar que contém intervenções de António Pinho Vargas, Virgílio Melo, João Pedro Oliveira, Mário Vieira de Carvalho e Maria João Reynaud, bem como uma entrevista ao compositor por Pedro Junqueira Maia. O livro termina com uma útil listagem de obras, partituras e discografia. Sem dúvida, recomenda-se a leitura na íntegra.
Também interessante é o trailer do documentário sobre Álvaro Salazar visível na página do Atelier de Composição (e aqui acima). Trata-se de um trabalho de Bruno Nacarato onde se podem ver e escutar fragmentos em que Álvaro Salazar fala sobre si próprio, sobre composição e sobre esta sua obra. Destaca-se a descrição que o compositor faz de si mesmo, de forma crua e clara: “Sou um homem velho, baixo, zarolho de um olho, vendo muito mal do outro, portanto, sou o que se pode dizer, em português, um pobre diabo… também não me quero pôr de rastos. Acho que tenho alguma capacidade de compôr num mundo onde há milhares de compositores, milhões, talvez, uns melhores, outros piores”. Sobre a sua obra fala-nos de “uma contradição assumida em muita da minha música, entre uma gramática tonal mas com repetição que polariza certas notas e certas coisas, logo dá a ideia de um tonalismo que não tem”.