O Palácio de Alverca, construído no final do século XVII, apresenta inúmeros contributos artísticos maioritariamente datados das primeiras décadas do século XX, quando as instalações sofreram remodelações enquanto eram propriedade do “Magestic Club”, o primeiro casino da capital portuguesa. Atualmente vigora como Casa do Alentejo, uma associação regionalista com o intuito de dinamizar a cultura alentejana em Lisboa, já há 99 anos.

Jorge Rey Colaço (1868-1942) foi um notável pintor no panorama artístico de Portugal, destacando-se as suas pinturas em azulejos. São conhecidos mais de mil painéis azulejares dos quais se salientam obras como a da Estação de São Bento (Porto), do Aquário Vasco da Gama (Lisboa), do Palácio Hotel do Buçaco, assim como em várias estações ferroviárias, igrejas e mercados municipais de norte a sul do país. O seu contributo na decoração azulejar da Casa do Alentejo é significativo e encontra-se em três salas, onde podemos observar retratados Os Lusíadas, uma cena de caça medieval e o quotidiano da Feira de Santa Eulália, cada qual com sua temática, embora combinadas com uma perspetiva popular.

 

 

O painel de azulejos “Feira de Santa Eulália” data de 1918-1919 e apresenta um ambiente rural, geograficamente localizado em Arouca, com vários episódios que ocorrem simultaneamente, entre os quais encontramos uma diversidade de instrumentos e grupos musicais. Através deste panorama azulejar identificamos várias atividades recorrentes na época, como a ceifa, a vindima, e a venda de produtos e bens alimentares, e a referência à música popular.

 

 

O episódio destacado retrata dois conjuntos musicais que se dirigem para a feira. Um trio instrumental (concertina, pandeireta e tambor) acompanhado por quatro mulheres que, eventualmente, poderiam cantar, e uma banda filarmónica acompanhada por um grupo de jovens que dançam e festejam ao som da música. É nesta cena que encontramos maior diversidade de instrumentos, num total de seis aerofones: dois clarinetes, dois fliscornes, um helicon e uma tuba (da esquerda para a direita, respetivamente).

 

 

No seguimento do painel “entramos” no cenário da feira, com tendas e carroças de comerciantes, assim como a venda ambulante. Através de um destes cenários, em particular, a representação da venda de castanhas assadas, podemos delimitar uma época do ano para a ocorrência desta feira, uma vez que se trata de uma fruta de outono.

 

 

O último episódio expressa a música não só através dos instrumentos musicais como pela dança que se verifica até por membros do grupo instrumental, nomeadamente pelo tocador de concertina e guitarra. A acompanhar estes músicos observamos mais dois tocadores de instrumentos de percussão, um tambor e um bombo (tambor de maior dimensão com um som mais grave, percutido apenas com uma baqueta).

Relativamente à prática musical de grupos instrumentais com a sonoridade de guitarras, concertinas, tambores e pandeiretas, tendemos a associar um carácter tradicional, uma temática que o artista Jorge Rey Colaço preserva na multiplicidade da sua vasta coleção de painéis azulejares.

 

Sara Martins assina o “Música entre Artes #12” a convite de Luzia Rocha.

Sobre o autor

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Nasceu no Seixal e toca acordeão desde os nove anos. É aluna da licenciatura em Ciências Musicais na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e colaboradora do INET-md. Desde sempre com uma forte ligação à cultura alentejana, tem desenvolvido a sua prática musical em torno do Cante Alentejano.