João Pedro Delgado inaugura o novo ano de 2015 com o lançamento do CD Viola Solo e Electrónica  Música de Compositores Portugueses. Quem o quiser procurar nas estantes de uma FNAC ou de qualquer outra loja de discos encontrará um objecto com um grafismo exemplar de Sérgio Currais: um branco cru, qual tela em branco, suporta uma viola em si transfigurada em algo espectral. A metamorfose de um instrumento com a matéria tão orgânica, como a madeira, para um vazio negro quase espacial, sendo verticalmente e horizontalmente cruzado com uma linha espectral sonora, deixa o observador inquieto e desperto para o conteúdo musical do CD.

 

 

Foram escolhidas obras de João Pedro Oliveira (n. 1959), Sérgio Azevedo (n. 1968), José Carlos Sousa (n. 1972), Jaime Reis (n. 1983) e Eduardo Patricarca (n. 1970). A obra de João Pedro Oliveira, Rust, é uma parte de uma obra mais complexa inspirada em elementos da natureza: Magma, Titanium, Burning Silver e Rust (ferrugem). Nas palavras do próprio autor, Rust, a ferrugem, dá a ideia de algo frágil, mas cuja aparência se pode confundir com o ferro. Este pressuposto é transposto para música por elementos melódicos que se quebram, dispersam e são novamente reunidos. Já a obra de Sérgio Azevedo, Sonata para Viola Solo, de contornos bastante diferentes, desenvolve-se à volta de uma ideia cromática que reaparece, um pouco disfarçada, por todos os andamentos. É de destacar na obra o ‘Prestissimo alucinante’. Na obra de José Carlos Sousa, Violeta’s, a música é apenas executada por um único violetista mas assume tal complexidade contrapontística que é sugerida ao ouvinte uma multiplicidade de violas que, na verdade, são uma única só. Em Fluxus, Transitional Flow de Jaime Reis destaca-se a particularidade de terem sido gravados sons de aviões do Aeroclube de Torres Vedras, depois sintetizados com técnicas que remetessem para a ideia de um fluxo musical que parte da viola d’arco e é expandido para a electrónica, isto nas palavras do próprio compositor. Numa homenagem a Gèrard Grisey (o fundador da escola espectral), Eduardo Patriarca constrói uma peça de forma circular com camadas que se vão criando sendo muito interessante o diálogo partilhado de micro-tons.

João Pedro Delgado (n. 1978) tem uma execução excelente, recomendando-se a audição e a compra deste registo em CD. É um contributo deveras interessante para a divulgação da música contemporânea portuguesa, muito particularmente desta selecção de compositores bastante jovens com uma carreira já consagrada no meio musical nacional e internacional.

Para quem desejar ouvir algo mais sobre o CD, pode seguir o programa de rádio da Antena 2, ‘Música Hoje’, no dia 28 de Fevereiro de 2015 à 01:00.


O disco pode ser comprado na Loja MPMP.


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Sobre o autor

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Luzia Rocha possui os graus de Licenciatura, Mestrado e Doutoramento em Ciências Musicais pela Universidade Nova de Lisboa. É investigadora no Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical (CESEM) da Universidade Nova de Lisboa. É membro do ‘Study Group on Musical Iconography’ e do ‘Study Group for Latin America and the Caribbean’ (ARLAC-IMS), ambos da International Musicological Society. É colaboradora na Rede Temática em Estudos de Azulejaria e Cerâmica João Miguel dos Santos Simões do Instituto de História da Arte da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e no Grupo de Iconografia Musical da Universidad Complutense de Madrid/AEDOM. Trabalhou como docente na Academia de Amadores de Música, Escola Técnica de Imagem e Comunicação (ETIC), Instituto Piaget (ISEIT de Almada, também como Coordenadora da Licenciatura em Música) e na Academia Nacional Superior de Orquestra e colabora actualmente como docente na Licenciatura em Jazz e Música Moderna da Universidade Lusíada. Tem participado como oradora, por convite, em conferências nacionais e internacionais e publicado artigos em periódicos com arbitragem científica. É autora do livro "Ópera e Caricatura: O Teatro de S. Carlos na obra de Rafael Bordalo Pinheiro".