Em Julho de 2010, o espólio de Frederico de Freitas, que tinha permanecido à guarda da família do compositor desde a sua morte, foi doado à Universidade de Aveiro pela filha do compositor, a Pro.a Elvira de Freitas. Este momento foi marcado simbolicamente pela assinatura de um protocolo entre a Universidade de Aveiro, representada pelo seu Reitor, Professor Doutor Manuel Assunção, e pela herdeira, em cerimónia que teve lugar no Palácio Foz, em Lisboa. O espólio foi seguidamente transferido para a Biblioteca da Universidade de Aveiro, onde está guardado para consulta e pesquisa.

Composto por manuscritos de música (erudita, para cinema, para teatro e dança, para teatro de revista, ado), correspondência, partituras editadas, fonogramas, transcrições de música tradicional portuguesa, fotografias, programas de concerto, recortes de imprensa e notas manuscritas, este espólio congrega elementos de interesse único para o estudo da cultura portuguesa do séc. XX nas vertentes da composição, interpretação musical e musicologia, assim como nas vertentes da dança e teatro, e para o estudo das organizações e estruturas de produção cultural do período do Estado Novo.

O trajecto diversificado de Frederico de Freitas e a relevância e abrangência da sua produção são aspectos que tornam particularmente interessante a pesquisa do seu espólio, que reflecte a diversidade da sua vida criativa, repartida entre a atividade como maestro, ensaísta, mas sobretudo compositor. Como compositor foi também ecléctica a sua produção, com impacto não apenas no campo erudito, mas também no teatro de revista, na dança (em associação com o bailados Verde Gaio) e no cinema (como autor da música de vários filmes, nomeadamente o primeiro filme sonoro português, A Severa), entre outras áreas.

Os manuscritos autógrafos são um dos elementos mais importantes do espólio; a grande maioria das obras de Frederico de Freitas está representada através de manuscritos, em muitos casos versões da mesma obra em fases de criação diversas. O espólio integra também esboços e obras não constantes de catálogos anteriores, assim como algumas obras que provavelmente nunca terão sido apresentadas, quer em vida do compositor, quer subsequentemente. Destacam-se, naturalmente, os manuscritos e versões preliminares das obras sinfónicas (nomeadamente bailados), mas também obras de câmara e obras vocais. Algumas das partituras documentam também o percurso de Frederico de Freitas enquanto compositor de música para revista, vaudeville e opereta ou cinema, actividade que o ocupou particularmente entre as décadas de 1920 e 1940.

O espólio inclui também documentos da maior importância para o estudo da criação e vida cultural na época do compositor, como a correspondência (com destaque para a correspondência com Francis Graça, director da companhia de bailados Verde Gaio, ou com o compositor e amigo Manuel Faria), os recortes de imprensa ou programas de concerto, assim como os fonogramas e documentação relativa à sua actividade como director artístico da delegação portuguesa da His Master’s Voice na década de 1930.

O estudo do espólio teve em 2010-11 uma contribuição importante da Fundação Calouste Gulbenkian que, através do seu programa de apoio à recuperação, tratamento e organização de acervos documentais, atribuiu aos Serviços de Biblioteca, Informação Documental e Museologia da Universidade de Aveiro os meios necessários para dar início a um projecto de organização do espólio.

A partir de Maio de 2013, às tarefas de organização do espólio passaram a beneficiar de um segundo apoio, por parte da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). Este apoio resulta de uma candidatura aos concursos de projectos de investigação científica e desenvolvimento tecnológico da FCT de 2010. O projecto, intitulado ‘Imagens da Terra e do Mar: Frederico de Freitas e a música na cultura portuguesa do séc. XX’, é financiado por fundos FEDER através do Programa Operacional Fatores de Competitividade – COMPETE, e por fundos nacionais através da FCT, e prolongar-se-á até Setembro de 2014.

Tendo em conta a carreira multidisciplinar de Frederico de Freitas, o projecto contempla duas linhas de abordagem principais: por um lado, a continuação do trabalho de recuperação e organização do espólio, que permitirá preservar e tornar acessível a gerações presentes e futuras um legado de grande valor cultural; por outro lado, uma vertente de investigação que permita não só a divulgação da música do compositor, mas também o seu estudo numa perspectiva abrangente e ligada ao seu contexto global na cultura portuguesa da sua época.

A equipa do projecto, liderada por Helena Marinho, reúne investigadores dos três polos do Instituto de Etnomusicologia.

Texto publicado na Glosa nº 7, p. 39.

Sobre o autor