Maria Helena Moreira de Sá e Costa: pianista e pedagoga, nasceu no Porto a 26 de Maio de 1913 e faleceu na mesma cidade a 8 de Janeiro de 2006. Pertencia a uma família de eminentes músicos. Seu avô materno, Bernardo Valentim Moreira de Sá (1853-1924) foi violinista, pedagogo, chefe de orquestra, director de coros, escritor, conferencista, organizador e impulsionador de importantes iniciativas que abriram novos horizontes à cultura musical portuguesa. Foi fundador da Sociedade de Concertos e da Sociedade de Música de Câmara que dariam origem ao Orpheon Portuense, criado em 1881, constituindo a sociedade musical mais antiga em toda a península. Criou também o quarteto de cordas com o seu nome e do qual fazia parte a violoncelista portuense Guilhermina Suggia e ainda um trio com o violoncelista Pablo Casals e o pianista Harold Bauer. Foi pioneiro como divulgador e incentivador da música de câmara, solística e orquestral na cidade do Porto, numa ocasião em que Lisboa vivia ainda muito influenciada pela ópera italiana. Fundou também, em 1917, o Conservatório de Música do Porto, um ano antes da criação do Conservatório Nacional de Lisboa. Luiz Costa (1879-1960 ), pai de Maria Helena, foi um exímio pianista, pedagogo e compositor, tendo sido um dos mais talentosos discípulos de Bernardo Moreira de Sá. Estudou também na Alemanha com Busoni e Vianna da Motta. Leonilda Moreira de Sá (1882-1963), filha de Bernardo Moreira de Sá e mãe de Maria Helena, foi uma talentosa pianista, também discípula de Vianna da Motta e Alexandre Rey Colaço, tendo realizado vários concertos com Pablo Casals e Guilhermina Suggia em Portugal, Espanha e Inglaterra. A violoncelista Madalena Moreira de Sá e Costa (1915-) é irmã de Maria Helena e foi a mais brilhante discípula de Guilhermina Suggia.

Helena Sá e Costa em Louisville, Kentucky.

Helena começou, desde os dois anos e meio, a sentir-se atraída pelo piano. A casa de seus pais era frequentemente visitada por músicos, poetas, pintores e escultores (Vianna da Motta, António Carneyro, Teixeira de Pascoaes, Guerra Junqueiro, António Arroyo, Teixeira Lopes). O ambiente familiar cultural e musicalmente tão rico em que cresceu foi o ideal para que pudesse vivenciar as primeiras experiências musicais e desenvolver, desde a infância e de forma harmoniosa, os seus excepcionais dotes musicais.

Recebeu as primeiras lições de sua mãe, que lhe ensinou não só a ler música mas também os fundamentos da técnica pianística. Apresentou-se em público aos seis anos, em audições de alunos de seus pais. Aos doze anos deu o primeiro recital no Salão Nobre do Ateneu Comercial do Porto. Foi pouco depois que começou a ter, alternadamente, lições com seu pai e com Vianna da Motta, passando a apresentar-se frequentes vezes em público, em recitais no Teatro de São João, serões musicais e festas de caridade. Nos anos 30, depois das lições recebidas de seu pai, participou em vários cursos em Lisboa, orientados por Lopes-Graça, Croner de Vasconcellos e Armando José Fernandes. Frequentou também, como ouvinte, as aulas de Luiz de Freitas Branco, que tinham muitas vezes lugar no Salão de Elisa de Sousa Pedroso – impulsionadora incansável da cultura musical lisboeta –. Maria Helena foi assídua dos serões musicais em casa desta mulher extraordinária, onde acorriam muitos artistas e intelectuais portugueses e estrangeiros.

Aos dezoito anos criou, juntamente com sua irmã Madalena, um duo de violoncelo e piano, cuja estreia se realizou em Maio de 1931, num concerto que teve lugar no Porto (Teatro Gil Vicente, Palácio de Cristal). A actividade artística deste duo foi intensíssima, dando concertos por todo o país, incluindo ilhas e Angola, e no estrangeiro – Espanha, Alemanha, Suíça e Bélgica–. Em 1932, com dezanove anos, fez a sua estreia no Teatro Nacional de São Carlos, tocando um concerto de Mendelssohn com a Orquestra da Academia dos Amadores de Música, sob a direcção de Pedro Blanc. Embora a sua formação e actividade artística tenham começado bem cedo, viria a completar os seus estudos académicos no Conservatório Nacional de Lisboa, como aluna externa, entre 1933 e 1935. Neste ano concluiu o Curso Superior de Piano na classe do mestre Vianna da Motta, obtendo a máxima classificação.

Antes, porém, de concluir os estudos no Conservatório, recebeu uma bolsa da Junta de Educação Nacional para estudar no estrangeiro. Paris foi a cidade eleita. Passou a estudar sob a orientação de Paul Loyonnet e Alfred Cortot, dos quais obteve as mais elogiosas referências. Estes dois pianistas marcaram-na profundamente. Loyonnet era considerado como o grande intérprete de Beethoven em França e Cortot, segundo a própria, era o apaixonante Mestre romântico, intelectual, autor de obras didácticas e biógrafo, sobretudo um artista do piano, um poeta do piano, já que seria quase desprimoroso chamar pianista a um ser tão complexo e tão rico, tão vasta era a sua musicalidade e a sua cultura (in Memórias, p. 47).

Durante os anos de 1933 e 1934, Helena teve a oportunidade de conhecer grandes artistas e grandes obras da literatura musical. Foi o caso do famoso festival comemorativo do 1.o Centenário do nascimento de Brahms, em 1933, organizado em Viena, no qual Helena e familiares puderam assistir a inúmeros concertos – nos quais actuaram Pablo Casals, Schnabel, Hindemith, Hubermann e Furtwangler, vindo depois a colaborar com eles.

Ao receber o Prémio Almada, em 2000.

Em 1936, com a sua irmã, partiu para a Alemanha a fim de se aperfeiçoar, frequentando ambas os cursos de música de câmara orientados por Paul Grummer, em Potsdam. Começou também a receber lições do famoso pianista, pedagogo e chefe de orquestra Edwin Fischer, cujos ensinamentos iriam marcar toda a sua carreira. Ao referir-se a este grande intérprete de Bach, afirma: Fischer sacudia o público e passava uma esponja sobre o outro Bach académico, de rotina, tão vulgar e banal de execuções sem chama (in Memórias, p. 51). Para ela, o génio de Bach estava muito para além do seu tempo, lutando por outros meios de expressão. A admiração e gratidão pelos ensinamentos transmitidos por Fischer levaram-na a escrever, em 1960, um interessante artigo na Gazeta Musical e de Todas as Artes (da Academia dos Amadores de Música) sobre as formas de ensino do mestre nos famosos cursos de Lucerna, na Suíça.

Enquanto permaneceram na Alemanha, as duas irmãs receberam vários convites do director da Kurzwellensen, Rádio de Berlim, para actuarem nesta estação. O ano de 1937 foi decisivo na carreira pianística de Maria Helena. Em Abril recebeu o Prémio Beethoven, atribuído pelo Conservatório Nacional de Lisboa. Seguiram-se então numerosos recitais e concertos com as Orquestras Filarmónica de Lisboa e da Emissora Nacional.

1938 foi também um ano particularmente intenso. Realizou várias digressões no estrangeiro, sob a direcção de Edwin Fischer, actuando como solista em Paris, Bruxelas, Bona e Colónia. Em 1939, as duas irmãs ainda puderam seguir os Cursos de Fischer, em Berlim, mas a eclosão da 2.a Guerra Mundial veio interromper todo este trabalho. Entretanto, o Orpheon Portuense atribuiu a Helena e a sua irmã o Prémio Moreira de Sá, avô das jovens intérpretes. No mesmo ano, Helena realizou um concerto no Teatro São Luiz, integrado na série “Evolução da Música de Piano”, promovido pela Emissora Nacional e organizado por Vianna da Motta. Foi nesta série de concertos que executou, juntamente com seus pais, ao piano, o Concerto para três cravos de Bach, com a Orquestra Sinfónica Nacional.

Ainda no mesmo ano, a 29 de Julho, a morte prematura de seu irmão Luís foi um duro golpe para a pianista. A sua actividade concertística foi interrompida. Mergulhou então no estudo e profunda análise do Cravo bem temperado – a única obra que, segundo as suas palavras, lhe proporcionou algum consolo perante a dor da perda do irmão –. Em Outubro do mesmo ano, foi convidada pelo Dr. Ivo Cruz – director do Conservatório Nacional – para ocupar o lugar do mestre Vianna da Motta que, entretanto, se aposentara. Nele permaneceu durante seis anos, tendo tido a oportunidade de colaborar com grandes músicos refugiados da Guerra que foram também convidados a leccionar no mesmo conservatório, nomeadamente o violinista Philip Newmann, com o qual formou um duo, o violoncelista Paul Grummer e a cantora Ans Bierman, com os quais realizou vários concertos, em Lisboa e no Porto.

Em relação à sua actividade pedagógica, em Lisboa, teve como discípulas Grazy Barbosa, Dinorah Leitão, Mercedes Carbonel, Lígia Ebo, Margarida Magalhães de Sousa, atingindo todas um alto nível artístico. A partir do início dos anos quarenta e sem nunca interromper a sua actividade de concertista, uma nova etapa começa na sua carreira artística. Passa a apresentar-se regularmente em público com um repertório muito rico e diversificado, colaborando com artistas nacionais e estrangeiros, nomeadamente o cantor Martial Singher, as cantoras Tony Rosado e Blanca Maria Seoane, o violoncelista Maurice Maréchal, os pianistas Vasarhélyi, Maria Cristina Pimentel, Marie Levêque de Freitas Branco, os violinistas Arthur Grumiaux e Giovanni Bagarotti. Recebeu, entretanto, o Prémio Vianna da Motta, instituído pela Emissora Nacional e destinado a galardoar, anualmente, um pianista português, mediante provas públicas.

O ano de 1945 foi particularmente intenso com actuações constantes em Espanha, muitas das quais com sua irmã, em concertos realizados por associações de cultura musical em Madrid, Barcelona, Vitória, São Sebastião, e por sociedades filarmónicas de várias cidades: Vigo, Valência, Bilbau, Santander, Oviedo, Gijon, Pontevedra, Málaga, Pamplona e Sevilha.

Com o fim da Guerra, interrompeu a sua actividade docente em Lisboa não só para dar resposta às solicitações de concertos, mas também para continuar o seu aperfeiçoamento. Assim, em 1947, voltou a seguir os cursos de Edwin Fischer e Paul Grummer em Zurique e Lucerna, colaborando com o próprio Fischer em numerosos concertos. Para ela, Fischer era o mestre dos mestres. A ele ficou a dever uma consciência mais profunda da grande tradição.

Em 1949, aceitou o convite para ensinar no conservatório da sua cidade natal, indo preencher a vaga deixada pelo seu pai. Aqui, a sua actividade docente prolongar-se-ia até 1970. No Porto formou várias gerações de pianistas, nomeadamente Maria Teresa Macedo, Fernando Azevedo, Francisco Monteiro, Fausto Neves, Manuela Gouveia, Adriano Jordão, Pinho Vargas, Sofia Lourenço, Caio Pagano, Pedro Burmester… Em lições particulares contam-se os nomes de Olga Prats, Teresa Vieira, Luísa Gama Santos, Teresa Meneres, Rui Pintão, Madalena Soveral, Francisco Pina, Raquel Correia, Elisabete Costa e Maria José Morais que, no Porto, procuravam frequentemente os seus ensinamentos. Numa geração mais jovem vamos encontrar os pianistas Álvaro Teixeira Lopes, Borges Coelho, Inês Soares, Manuela Costa, Paulo Ribeiro da Silva, Emídio Teixeira, Maria do Céu Camposinhos, Helena Marinho, Ivete Rebelo, Teresinha Xavier e João Paulo Santos.

Em 1954, 1955 e 1961, além de tomar parte activa nos cursos regidos por Pablo Casals e Sandor Végh, na Suíça, a convite dos mesmos, para acompanhadora oficial, apresentou-se frequentes vezes nas Rádios de Lausana, Genebra e Zurique. Segundo a própria, o violinista Sandor Végh influenciou-a muito, sobretudo na sua visão da música de câmara, do sentido construtivo das obras e, especialmente, da arte da variação. Foi com este violinista que gravou a integral das sonatas de Beethoven para violino e piano. Foi também na década de cinquenta que iniciou uma intensa actividade artística juntamente com sua irmã, integrando o Trio e Quarteto Portugália do qual faziam parte François Broos e Henri Mouton.

Nas décadas de sessenta e setenta viria a colaborar com outros intérpretes de renome internacional, nomeadamente o violoncelista Janos Starker, Reine Flachst, Maurice Eisenberg, Luis Leguia, Maurice Gendron, Michael Flacksmann, o pianista Harry Datyner, os violinistas Michel Chauveton, Sandor Végh, Lola Bobesco, Milanova, Clara Bernard, Alberto Lysy, Ruggiero Ricci e ainda os cantores Bernard Kruysen e Rita Gorr. Ainda nas duas décadas referidas, foi frequentemente convidada para participar nos festivais da Gulbenkian, Estoril, Espinho, Sintra, além de outros no estrangeiro como o de Pablo Casals, em Prades, o de Música Contemporânea em Cità di Udine (Itália), Estrasburgo, Wiesbaden, Haarlen, Maiorca e outros… Muitas digressões estiveram associadas a cursos de interpretação, a solo ou em duo, com sua irmã. É o caso das digressões a Angola e Moçambique (1959, 1966, 1971), à Madeira e Açores (1968 e 1973), e à Bélgica, Itália e Brasil, estas já na segunda metade dos anos setenta.

Realizou igualmente vários concertos e cursos de interpretação em universidades dos E.U.A., entre 1968 e 1978, apresentando-se em estações de Rádio e Televisão de vários estados (Tennessee, Virgínia, Carolina do Norte, Maryland, Luisiana, Kentucky, Texas, Rhode Island, Massachusetts, Connecticut), com orquestras dirigidas por David Epstein, Kenneth Schnewerk, Willem Bersch e Peter Fuchs.

Em Portugal, praticamente todos os organismos promotores de concertos solicitaram a sua colaboração. O seu nome aparece na programação de centenas de concertos quer a solo, quer em agrupamentos de câmara, quer com orquestras – tendo trabalhado com todos os maestros portugueses –.

O seu repertório foi influenciado pela sua formação de raiz germânica, que já vinha do avô materno e dos pais, tendo todos estudado na Alemanha. Os ricos universos sonoros de Bach, Beethoven e Brahms eram-lhe familiares, desde a infância e juventude. O fascínio por Mozart nasceu também na sua juventude. Embora a orientação pedagógica do mestre Vianna da Motta tenha sido decisiva na sua formação estética de raiz germânica, não foi apenas influenciada pela escola alemã. De acordo com Filipe Pires (1996), o reflexo da linha francesa de natureza romântico-impressionista, presente na obra de seu pai, já se lhe havia sido transmitido – e incentivado o seu trabalho em Paris. Os contactos com Cortot e com o meio revelaram-lhe não apenas Saint- Saëns, Debussy e Ravel, mas também Chopin e Schumann, proporcionando-lhe inesgotáveis fontes de confronto e enriquecimento. Bastante tempo depois, com Nadia Boulanger, sistematizaria a dissecação das obras, estilos e formas, fortaleceria a compreensão estética, estabeleceria elos mais fortes entre a Música e a Vida (p. 37). Mas a sua natureza intrinsecamente ibérica, ainda segundo a análise do mesmo musicólogo, não a limitou aos repertórios já referidos. A sua convivência e colaboração com músicos espanhóis, com destaque para Ernesto Halffter, profundo conhecedor de Falla, traduziu-se num interesse crescente pela música local e sua inclusão nos programas de concerto.

Uma das suas preocupações constantes foi a divulgação da música portuguesa, quer em Portugal quer no estrangeiro. Vários compositores nacionais lhe devem as primeiras audições das suas obras. É o caso das Fantasias de Bomtempo e de Luiz Costa (seu pai), os Concertinos de Lopes-Graça e Álvaro Cassuto, os Concertos de Armando José Fernandes e Joly Braga Santos, a Balada de Luiz de Freitas Branco e tantas outras… Foi a época da criação da Sonata – núcleo dedicado à música do século XX, com numerosas actuações, sob a égide de Lopes-Graça e Francine Benoit –. Muitas das obras foram dedicadas a Helena Sá e Costa.

Ao longo de toda a sua vida artística, foi ampliando e enriquecendo o seu repertório pianístico, que abrangia os mais diversos géneros e estilos. Porém, a sua grande paixão foi Bach – um dos maiores génios de toda a História da Música –. Ficou célebre a sua interpretação do Cravo bem temperado aos microfones da Emissora Nacional, em 1940, com a execução inaugural dos primeiros vinte e quatro Prelúdios e Fugas. Em 1946, apresentou a versão integral em dez concertos comentados por Cláudio Carneyro, realizados no Conservatório de Música do Porto.

A mesma integral foi apresentada em Lisboa, Espanha, Inglaterra e Suíça. Em 1963, repetiria o 1.o volume no concerto final dos Cursos de Férias da Costa do Sol. O sucesso foi tal que Joly Braga Santos comentaria o concerto nestes termos: a realização foi, digamos, uma façanha histórica, não apenas pelo facto de a ilustre pianista se ter abalançado a executar, numa única noite e de memória, os vinte e quatro prelúdios e fugas, mas muito principalmente pela maneira admirável como o fez. […]. Só aos maiores pianistas é possível atingir aquela maturidade técnica, artística e intelectual, capaz de dominar globalmente tal colosso, a ponto de o transmitir de uma maneira perfeita, total, como Helena Costa o fez. (Diário da Manhã de 23/09/63).

Há ainda a considerar no seu repertório solístico os ciclos de recitais de cravistas espanhóis e franceses, a música desde o século XVII até ao século XX e uma antologia de música para crianças, entre outras temáticas. A sua colaboração no duo com sua irmã e a participação no Trio e Quarteto Portugália permitiram-lhe não só colaborar com outros intérpretes, mas também enriquecer o seu repertório com obras de grandes mestres como Haydn, Mozart, Schubert, Schumann, Beethoven, Brahms, Debussy, Ravel e Manuel de Falla. Do repertório de compositores portugueses destacam-se Carlos Seixas, Bomtempo, Luiz Costa, Armando José Fernandes, Croner de Vasconcellos, Cláudio Carneyro, Lopes-Graça, Joly Braga Santos e Fernando Corrêa de Oliveira.

A par da sua actividade de concertista e pedagoga, a sua colaboração em júris de concursos nacionais e internacionais foi uma constante, sobretudo a partir de 1980. Dos nacionais contam-se os Prémios Luiz Costa, no Porto, Carlos Seixas e João Arroyo, em Coimbra, Cidade da Covilhã, Guilhermina Suggia, Juventude Musical Portuguesa, Elisa Pedroso, Jovem Geração (do Conservatório Nacional), Música de Câmara (do Estoril) e Jovens Músicos (Rádio Difusão Portuguesa). Dos concursos internacionais destacam-se o Vianna da Motta, em Lisboa, Juventudes Musicais, em Berlim e Palma de Maiorca, Rainha Sofia, de Madrid, José Iturbi, de Valência, Maria Callas, em Atenas, Beethoven, em Viena e Bruxelas, Mozarteum, em Salzburgo, e outros realizados em Bilbau, Orense, Anvers e Canadá. Em 1983, com a criação da Escola Superior de Música do Porto, já aposentada do conservatório, foi convidada para presidir à sua comissão instaladora. Lançou as bases de funcionamento deste estabelecimento, tendo sido também presidente do conselho científico até 1989, ano em que, a seu pedido, deixou de exercer ambos os cargos. No mesmo ano, o conservatório prestou-lhe uma reconhecida homenagem.

Até aos últimos anos da sua vida, continuaram a acorrer à sua residência não só alunos portugueses mas também estrangeiros, vindos de todas as partes do mundo, ansiosos por aperfeiçoar os seus conhecimentos. Muitos dos seus alunos portugueses deram os mais comoventes testemunhos de reconhecimento e admiração. O compositor e musicólogo Filipe Pires, seu grande amigo, compilou esses testemunhos na obra que lhe dedicou. Desses testemunhos ressaltam aspectos que ajudam a conhecer melhor a personalidade da famosa pedagoga e que vale a pena referir. Em jeito de síntese, Maria Helena tinha a preocupação de transmitir aos seus alunos a enorme herança musical recebida dos grandes mestres do piano. Era uma “mãe musical”, uma mulher de invulgar inteligência com uma profunda cultura musical, notável pianista e grande intérprete. Sabia incutir nos alunos o gosto pela música, o calor humano, a confiança. Era exigente, mas nunca ditadora. Ensinava a “saber ouvir” o que tocavam. Ia ao encontro da personalidade e capacidades de cada aluno.

Eis ainda três testemunhos de pianistas de gerações diferentes. De Adriano Jordão: Helena Sá e Costa deu-me asas para voar, estimulou a minha imaginação, obrigou-me a pensar, a extrapolar de obra para obra, a encontrar as minhas próprias soluções […]. Aprendi com ela a amar a Música, a encontrar assim um sentido para a minha vida. (Pires, 1996, p. 95). De Pedro Burmester: a sua formação pianística e musical é impressionante e praticamente ímpar no meio musical português. A sua contribuição no campo do ensino ficará para sempre marcada nas futuras gerações de pianistas portugueses.(p. 98). E eis como via e sentia a música, no testemunho de Maria Teresa Macedo: força aglutinadora, mensageira e expoente de Beleza. (p. 99).

A sede de conhecimento e perfeição, ao longo de toda a sua vida, conduziu Helena a uma busca constante de novos caminhos e soluções, quer no seu trabalho de intérprete e pedagoga, quer mostrando novos horizontes culturais. Os seus excepcionais dotes de comunicadora nata, a sua simpatia, modéstia e grande simplicidade, são traços inquestionáveis da sua forte personalidade. Por isso, não admira que a estima e o reconhecimento do público fossem uma constante. As numerosas distinções de que foi alvo são a confirmação do prestígio que adquiriu e da sua importante contribuição para a causa da música e da cultura portuguesas, sempre com o objectivo de abrir novos horizontes, descobrir e apresentar novos valores: participou na Comissão da “Experiência Pedagógica” presidida por Madalena Perdigão; foi vogal, respectivamente, dos Conselhos Português da Música, da Cultura e da Televisão; e directora artística do Orpheon Portuense e dos Encontros Musicais de Guimarães.

No começo dos anos sessenta recebeu o Prémio Laranja (Laranja de Prata), atribuído pelo Diário Popular, em homenagem à sua actividade artística. Em 1966 recebeu, juntamente com sua irmã Madalena Sá e Costa, o Troféu da Câmara Municipal de Sintra, no âmbito do Festival de Sintra, entregue por Aldo Ciccolini e Sandor Végh. Em 1982, a 10 de Junho, foi galardoada com o Grau de Comendador da Ordem Militar de Santiago da Espada, entregue por Ramalho Eanes. Em 1983 foi homenageada no Porto – Palácio da Bolsa – pelos seus alunos, em que actuaram Pedro Burmester e o duo Oliveira Lopes e Fernando Jorge Azevedo. No mesmo ano recebeu a Medalha da Associação Comercial do Porto. A partir do ano lectivo de 1983-1984 foi criado o Prémio Helena Sá e Costa pela Fundação Eng.o António de Almeida, para atribuir anualmente aos alunos do Conservatório do Porto que terminassem os seus cursos com classificação igual ou superior a dezoito valores. Mais de duas dezenas de alunos receberam este prémio.

Em 1985 com a Medalha de Mérito da Cidade – Grau Ouro, atribuída pela Câmara Municipal. Em 1987, é homenageada em Lisboa, no Teatro São Luiz, numa das séries de divulgação musical promovidas pelo Maestro José Atalaya. Em 1988 recebeu a Medalha da Cidade de Castelo Branco, seguida de um recital de Jorge Moyano. Em 1989 deixou a sua actividade docente no Conservatório do Porto, tendo sido homenageada por alunos e professores. No mesmo ano recebeu a Medalha de Mérito da Secretaria de Estado da Cultura. Em 1994 foi criado um novo Prémio Helena Sá e Costa. Em 1995, além de receber o Prémio Gambozinos na Câmara de Matosinhos, atribuído pela Escola de Música, foi criado, no mesmo ano, o Programa Fórum Musical, emitido pela RTP 2, dedicado a Helena Sá e Costa. Em 2000 recebeu o Prémio Almada e, durante o Porto 2001 – Capital da Cultura, foi criado, em sua homenagem, o Teatro Helena Sá e Costa, situado na Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo.

No que respeita aos registos sonoros das suas interpretações, muitos encontram-se em estações de rádio e televisão nacionais e estrangeiras onde actuou. As suas gravações em disco são escassas e estão esgotadas.

Pode concluir-se que soube sintetizar e transmitir com profundo conhecimento o que aprendeu nas escolas germânica e francesa, introduzindo-lhe uma forte componente ibérica. A sua grande sensibilidade e abertura aos repertórios barroco, clássico, romântico, impressionista e contemporâneo reflectiu-se ao longo de toda a sua vida de concertista e pedagoga, plena de música que para Helena Sá e Costa era, na verdade, a mensageira e o expoente da Beleza.

Bibliografia

SÁ E COSTA, Helena, Uma Vida em Concerto – Memórias, Edição Campo das Letras, Porto, 2001

PIRES, Filipe, Helena Costa – Tradição e Renovação, Edição da Fundação Eng.o António de Almeida, Porto, 1996

As fotografias neste artigo publicadas foram generosamente cedidas por Luís Gaspar, a quem se agradece com o maior reconhecimento.

Discografia

J. S. Bach

1.o vol. do Cravo bem temperado – Columbia / Valentim de Carvalho, LP8E 14740154, LP8E 14740155.

Fernando Corrêa de Oliveira

Trio, op. 17 (Trio Portugália ); 7 Estudos, op. 18; Variações, op. 10 – Parnaso, LP 962B; O Príncepe do Cavalo Branco – Parnaso, LP 962C; doze das 50 Peças para 5 dedos, op. 7 – Parnaso, LP 965E.

Luiz Costa

Prelúdios op. 9, n.os 1-4 e 6; Cachoeiras da Serra; Roda o vento nas searas; Pelos montes fora; Campanários; Estudo, op. 10, n.o 2 – Educo-Ventura, Califórnia, LP 4108.

Fernando Lopes-Graça

Concertino para piano, cordas, metais e percussão (obra da qual é dedicatária) com a Orquestra Filarmónica de Budapeste, direcção de János Sándor – Melodia / SEC, LP 36.4 e CD.

Obras de diversos autores

Disco de 45 RPM, editado em Nyon, Suíça, sob a etiqueta NYMA, por Paracélsia, SARL.

Texto publicado na Glosa nº 8, p. 45-49.

Sobre o autor

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Idalete Giga é licenciada em Ciências Musicais pela Universidade Nova de Lisboa e doutorada em Ciências da Educação pela Universidade de Évora onde foi docente de 1991 a 2007, no Departamento de Pedagogia e Educação. Estudou também Canto Gregoriano, Direcção Polifónica e Pedagogia Musical Ward com vários mestres. É autora de artigos de temática variada com especial incidência na voz da criança. Dedica-se também à regência coral. Traduziu e adaptou para a língua portuguesa várias obras de pedagogia musical de Justine Ward (1879-1975). Colaborou no 'Dicionário no Feminino', na 'Enciclopédia da Música em Portugal no séc. XX' e é co-autora de 'Mulheres do Alentejo na República'. Em 2005 recebeu a Medalha de Ouro da Dom Mocquereau Fund da Universidade Católica Americana pela sua acção em favor do Canto Gregoriano e do Método Ward em Portugal.